segunda-feira, 20 de maio de 2019

MENSAGEM DE ÍNDIO

Maré de Lua (Arquivo JRS)

               Na metade de 1969, quando eu era bem criança e brincava pelas grimpas dos morros, na praia da Fortaleza, escutei que os americanos foram à Lua. Assim eram as notícias: “Neil Armstrong e outros aterrissaram na superfície lunar”, “Emílio Garrastazzu Médici tomará as rédeas do governo” etc. Enquanto isso o Zezinho e as demais  crianças continuavam correndo pelos morros, badejas, costeiras e outros lugares dessa natureza exuberante. Todos os espaços estavam à nossa disposição. Muitos diziam: “Imagine se Deus vai permitir que alguém conheça o céu e seus mistérios!”. Na Terra, estava “tudo sob controle”, inclusive na nossa terra. 
          
         Lá no morro, onde era a nossa casa, saindo no terreiro a gente já estava debaixo de uma frondosa aroeira, de onde avistávamos os rolos de fumaça que saíam dos navios que passavam bem longe, no largo, quase na linha do horizonte. Pelos caminhos quase sempre lisos, de barro amarelo, vovô e os menos velhos carregavam cachos de bananas, balaios de mandiocas e outras sustâncias dos nossos eitos de roças que se espalhavam até onde a vista alcançava. Em casa, nos intervalos de um trabalho mais exigente, mamãe e vovó costuravam nossas roupas. Sacrifício para as crianças era ir às aulas enquanto passarinhos, rios e mar estavam sempre descompromissados. Ficávamos em dúvida entre pegar caderno e lápis ou sair correndo alegremente sem destino pelos caminhos de servidão. Gostoso era brincar e aprender e aprender brincando: caniços viravam apitos, folhas de bastão imitavam cornetas, bodoques disparavam em toda direção, pescarias se multiplicavam... Cada farinhada era uma festa para nós crianças. Mas festa de verdade só na capela, onde a comunidade se encontrava regularmente. Tinha fogueira. Tinha foguetes. Tinha consertada. Tinha doce de mamão. Tinha bolo e tinha pipoca. Naquela época do ano, assim que chegava o tempo da tainha, a gente já estava ansioso pela tal festa.  

            Agora, passou o tempo... Passou tudo! O espírito de ambição se alastrou “e paira sobre as águas”, contagiando tudo, contaminando tudo. Tem uma história, voltando aos astronautas do início, que ao saber que eles iriam à Lua, um índio sábio mandou uma mensagem por intermédio deles, mas na língua dele. Ao decifrarem o recado, os que iriam embarcar na nave ficaram boquiabertos: “Não acreditem em única palavra do que essas pessoas estão lhe dizendo. Eles vieram roubar suas terras".



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