sábado, 4 de maio de 2019

ECOTERRORISTA

Nas grimpas da Mantiqueira (Arquivo JRS)


        Por onde ando boto reparo em tudo. Ou melhor, tento observar o máximo possível. Quando criança, se deslocando por mar ou pelas pedras das costeiras do entorno do Perequê-mirim, eu avistava uma mata diferente entre o Saco da Ribeira e a Ribeira: era um eito em forma triangular que avançava morro acima, se destacando bem da nossa tão familiar mata. Papai explicou um dia: “É pinheiro, meu filho. Alguém plantou as mudas por ali”. Cresci. Aquelas mudas se tornaram gigantes, tomaram conta do morro todo e continuam se espalhando pelos morros vizinhos. Elas se dão muito bem na nossa terra!

        Quem já teve oportunidade de andar sob tal vegetação vai entender bem o problema: o pinus (pinheiro) não serve de alimento a nenhum animal, a ave alguma; suas folhas resinosas impedem que as plantas nativas se desenvolvam ao seu redor. Na verdade, nunca vi germinar em seu cisqueiro nenhum jacatirão, nenhuma tinticuia, nenhuma pixirica… Ou seja, essa espécie exótica está matando as espécies nativas. O resultado previsível é a diminuição de aves e de animais por falta de alimento, por modificação em seus habitats.

        Quando passo por outras terras também vejo, além do pinus, eucaliptos aos milhares. Tais cultivares em contextos assim são perniciosas, sobretudo quando interesses econômicos abafam estudos sérios prevendo que os danos são muitos e superiores aos lucros de alguns poucos indivíduos. Nesta época, a partir do mês de maio, regiões potenciais em araucárias (que produzem o delicioso pinhão) deixam de lucrar porque não têm mais essa espécie nativa. Em seus morros imperam pastos e plantios de eucaliptos e pinus. Só de vez em quando se avista uma araucária solitária, uma remanescente que vem da pré-histórica.  Na lógica capitalista, essas espécies exóticas estão vencendo. Assim escreveu o historiador Harari, em seu livro Sapiens: “Os luxos tendem a se tornar necessidades e gerar novas obrigações”. E assim continuamos a nossa onda devastadora. Perde todo mundo. Perde o planeta. De vez em quando eu me pego sonhando que estou entrando nesses espaços para derrubar essas plantas que sufocam as nossas espécies nativas, que  reduzem a biodiversidade. “Ah! Nas grimpas da Mantiqueira e na Serra do Mar eu sou um ecoterrorista!”.

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