Cais do Porto - 1939 - Antônio Gomide |
No domingo
passado (8 de outubro de 2017) aconteceu uma coisa bonita em Ubatuba: um grupo
de maracatu, juntamente com algumas lideranças da igreja católica, realizaram
uma cerimônia na praça Nossa Senhora da Paz de Iperoig, onde existia a “devoção
aos santos dos pretos”, conforme me disse um dia o saudoso Sabá. Vou republicar
um trecho para ajudar a entender esta prosa.
Em Ubatuba só existia a Igreja Matriz, no
centro da cidade, mas não era essa atual. [Era na Rua Conceição, numa área que
abrangia o Ateneu Ubatubense e antiga Câmara Municipal]. Só que os escravos,
todos os pretos, não podiam entrar nela. O que acontecia era de acompanharem seus
donos, mas nem pensar em entrar no templo. Só que a negralhada já tinha ficado
dependente dos ensinamentos da religião dos brancos e queriam de qualquer modo
poder entrar na igreja. Também havia branco piedoso que não se conformava em
ver a minha gente sem lugar decente para a devoção. Como fazer isso se o
costume religioso dizia que os dois –branco e preto – não podiam se misturar?
Para encurtar a conversa, porque eu não
sei os detalhes, acharam a solução: construir uma igreja para os pretos. ‘Era
pequena, mas era bonitinha’ dizia a mamãe. Ficava também no centro da cidade,
mais perto do rio [Grande]. Hoje não existe mais. Nem eu conheci essa igreja em
pé. Hoje, no lugar dela há uma praça [Nossa Senhora da Paz de Iperoig]. É no
caminho para a Rampa [área do mercado de peixe], quase chegando no Sobrado do Porto
[Casarão da Fundart]. Por volta de 1910, a Igreja de São Benedito, mais
conhecida por Igreja dos Pretos, foi demolida. Parte do altar dela, dizem, foi
levado para compor aquele bonito altar da Matriz [Exaltação da Santa Cruz].
Depois disso, preto e branco puderam frequentar o mesmo lugar sagrado”.
Como é
importante recuperar as memórias da nossa gente, da nossa terra! Afinal, os
africanos começaram a chegar a partir de 1533 nesta terra chamada Brasil. A
historiadora Mary Del Priore repassa que “em
carta datada de 3 de março de 1533, Pero de Góis informava que pretendia
receber dezessete peças de escravos ‘forros de todos direitos de frete que soe
pagar’. [...] Pelo alvará de 29 de março de 1559, o rei fazia mercê àqueles que
tinham construído engenhos no Brasil, permitindo-lhes mandar resgatar ao rio do
Congo e de lá trazer para cada um dos ditos engenhos até 120 peças de escravos
resgatadas às suas custas, os quais virão no navio que o dito feitor (da ilha
de São Tomé) lá enviar para trazer escravos”.
Aquela praça
merece outras celebrações e um painel histórico ensinando nossa história e os
valores do nosso povo (caiçara) que faz parte deste caldo cultural brasileiro!
Ah! Que
saudade do Velho Sabá!
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