domingo, 8 de novembro de 2015

TEMPO DE FUNÇÃO

Mestre Zé Pereira (Arquivo JRS)

              “Ai meu São Gonçalinho
                Ele é tão bonitinho
                Ele dorme na cama
                Ele bebe seu vinho
        Ai meu santo São Gonçalo
        Ai meu Santo São Gonçalo”.

Pensando neste verso, parte de uma música que gravei com o saudoso Aristeu, na Praia da Ponta Aguda, em meados de 1980, me coloquei no espírito do 1º Encontro de Fandango Caiçara, ocorrido dias atrás, em Ubatuba. Em especial presto homenagem à Mercedes e sua equipe que se esmeraram no preparo do peixe com banana verde. Bons tempos na comunidade do Itaguá, né Mercedes? Né, Élvio?
Comecei o dia ainda pesaroso com a notícia dada pelo Nísio, um caiçara dançador de Congada, natural do Sertão do Puruba: “O Pedro Brandão morreu, Zé”.
 Foi um golpe perder mais um cantador de Ubatuba. O Aristeu da Ponta Aguda me garantiu que a música e a dança de São Gonçalo aprendida por ele na década de 1950, foi ensinada pelo Pedro Brandão: “Ele, a cada ano corria a Folia por todas as praias e sertões. E nós aprendemos com ele tudo isso que nós continuamos até hoje. De acordo com o Pedro Brandão, São Gonçalo é protetor dos violeiros e santo da fertilidade, protetor das prenhas". Depois da parte votiva, das cantorias sagradas, vinha a parte profana. Era a função, parte sagrada (que não podia faltar) da religiosidade dos caiçaras, onde os dançarinos suavam em ciranda, cana-verde, xiba, tontinha etc. até o sol despontar no horizonte do mar. Naquele tempo, onde somente os Caminhos de Servidão sustinham nossas passadas, andar por todos os lugares não era fácil! O Pedro morava no Sertão do Puruba; o Aristeu na Ponta Aguda. Ou seja, quase setenta quilômetros separam os dois bairros.
Outra notícia que me surpreendeu foi a da morte do querido professor Hércules Cembranelli. Com este mestre eu aprendi a gostar ainda mais de estudar História. Assim a morte vai levando as nossas bibliotecas humanas que dependem de nossas memórias para se tornarem imortais.
Espero que esse encontro, que teve representantes da Cananéia até Paraty, se torne o marco de reorganização da cultura caiçara. Assim, transcrevo a letra cantada por Pedro Brandão. Está no CD Canto Caiçara, de 1999:

“Este Bendito louvado
Foi feito com fundamento
Recordai as minhas culpas
Suspendei meu pensamento”.



E perguntei ao Nísio: “Em que idade tava o Pedro?”. “No documento ele tinha 93 anos. Mas ele era do mato, né Zé. Gente assim tem muito mais daquilo que tá no papel!”.

3 comentários:

  1. Lindo texto amigo Zé Ronaldo, pena que aos poucos estamos perdendo os Caiçaras antigos que podem transmitir nossa cultura aos mais novos e a nós mesmos, por isso é muito interessante sairmos a campo a busca destas relíquias.

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    1. Certamente, Pedro. Vamos fazendo um pouquinho, conforme o tempo e os compromissos. Um abraço. Tenha uma boa semana,

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    2. Este comentário foi removido pelo autor.

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