Jundiaquara, a toca do bagre registrada pelo artista em 1836. |
Modelos de pinturas de Benjamin Mary Utilizados na Fora Brasiliensis, de Heitor de Assis Júnior, nos permite conhecer um pouco de Benjamin Mary, o artista embaixador que deixou registrado um pouco de Ubatuba na primeira metade do século XIX, quando o café era o nosso principal produto e o nosso porto tinha uma intensa movimentação.
Vamos pensar cada indivíduo como membro da cultura. Vamos pensar a cultura como um amplo leque, em todos os aspectos possíveis. Vamos pensar a cultura caiçara como tudo isso tendo se estabelecido por determinantes históricas dentro de um território entre a serra e o mar, na caiçara (a cerca natural assim nomeada pelos tupinambás).
Hoje, a partir do trabalho do Heitor, um pesquisador com atenção especial à arte, me proponho a indicar mais elementos para refletir em torno do espaço onde o ser caiçara se constrói e se aperfeiçoa dando a sua contribuição na maneira de interpretar o mundo.
Alguém já disse que "a cultura é um conceito que transita tanto pelo universo individual quanto pelo coletivo". Agora eu acrescento que esse universo individual é tanto do sujeito quanto do lugar, da soma que preencheu e deu a definição da cultura caiçara.
Então... desfrutemos do artista que há quase duzentos anos reparou bem em tudo que fazia parte do espaço ubatubano.
Benjamin Mary (1792-1846) nasceu em Angers na Bélgica em 21 de
janeiro de 1792 e teve seus primeiros contatos com plantas através de seu tio
materno Joseph Parmentier, conhecido cultivador de jardins e amplos parques da
Europa. Segundo Martius, muito cedo, Mary já era capaz de reproduzir com grande veracidade e
realismo a natureza das plantas. Mary veio ao Brasil, como embaixador da
Bélgica, tendo percorrido, nos anos de 1834 a 1837, as regiões montanhosas da
Serra da Estrela, da Serra dos Órgãos e Ubatuba na Província de São Paulo. Mary
produzia três ou quatro desenhos por dia como se estivesse fotografando a costa
marítima da Serra do Mar, a qual percorria a pé ou em canoa. Durante suas
viagens, Mary passou do Rio de Janeiro para Ubatuba com escalas em Sepetiba,
Mangaratiba, Itaguaí, Ilha Grande, Angra dos Reis, Parati, etc.
Em 1971, Luís Viana Filho mostrou a Ferrez outro álbum também
adquirido em Paris: “Brésil nº 4 – 66 vues dês environs de Rio de
Janeiro et dês forêts Vierges, dessinées par B. Mary – Comprenant: - 31 dessins
à la sépia – 35 dessins au crayon”. Todos medem 260 x 350 mm, com
índice, datas e legendas das pranchas, abarcando um período de 28 de janeiro de
1834 até fevereiro de 1838. Esses dois álbuns, nº 4 e nº 8, contém 129
pranchas, sendo que o nº 8 está incluso no acervo do colecionador Paulo
Fontainha Geyer.13
Mary, segundo Gilberto Ferrez14, “conviveu ou teve o ensejo de
conhecer homens com as mesmas inclinações” do pintor Félix Emilio Taunay,
diretor da Escola Imperial de Belas Artes. Taunay teria enaltecido as
habilidades artísticas de Mary em discursa proferido em 15 de março de 1838:
“Às Belas
Artes com dobrada razão se aplica o que diz o orador romano do estudo em geral
e em particular das Letras: nutrem a adolescência, deleitam a velhice, consolam
o infortúnio, ornam a prosperidade. Estas últimas palavras trazem à vossa
lembrança o ilustre exemplo de um diplomata benigno, hóspede deste país, filho
de outra terra em que o trabalho artístico faz parte do patrimônio nacional,
dotado ele mesmo de talento não vulgar, e que, ao retirar-se para a Europa,
leva uma coleção riquíssima de vistas do Rio de Janeiro, por ele desenhadas”.
Em 1838, após deixar o Brasil, Mary teria se encontrado
pessoalmente com Martius e este, teria elogiado muito seus desenhos.
A presença de artistas nas excursões naturalísticas foi importante
num período em que os aparelhos de captação de imagens ainda não estavam
desenvolvidos, assim, os diversos espécimes vegetais herborizados durante as
expedições científicas que perdiam suas cores no processo de preparação,
tornavam a participação do pintor desenhista um fator necessário para a
preservação dos detalhes de cada exemplar.
A técnica litográfica permitia ao editor
acrescentar ao modelo artístico espécies com detalhes anatômicos e estruturais
importantes para sua identificação taxonômica, aliás, desenhos detalhados, até
hoje, são utilizados com a mesma finalidade. Além disso, os exemplares ou
espécies de interesse eram acrescentados à paisagem conforme a necessidade do
autor, baseado em anotações colhidas décadas antes, durante as suas viagens
naturalísticas. Em alguns modelos, nota-se um panorama geral do local e/ou do
vegetal; na litografia, o cientista, a partir de suas anotações de viagem,
incluiu espécies vegetais mais adequadas àquele ambiente, entre elas, diversas
espécies de palmeiras que eram bastante caras a von Martius que,
inclusive, dedicou-lhes toda uma obra, a Historia Naturalis Palmarum
Riquezas esquecidas deste lugar de muitas histórias...
ResponderExcluirMuito bom!!!
Riquezas esquecidas deste lugar de muitas histórias...
ResponderExcluirMuito bom!!!