Da direita para a esquerda: Tio Tião, mamãe, tio João, tia Maria, tio Nelson e tio Tonico - Arquivo JRS |
Um relato chegou em mãos. Interessante e familiar. Bem familiar! Quem escreveu é um viajante, um turista que quer viver, nas ocasiões possíveis, junto à cultura local. E isso ele faz há tempos, segundo eu fiquei sabendo. O personagem principal, reconheci logo, é o meu tio Sebastião, filho do vovô Armiro e da vovó Eugênia, o querido “Tiãozinho”. O lugar é a praia da Fortaleza. Acompanhe e sinta a proximidade de um amigo da cultura caiçara:
Desde
a metade da década de 1980 eu conheço esse pedaço de Ubatuba que vai da praia
Grande do Bonete até a Fortaleza. Lugar lindo demais! Nos primeiros anos eu
acampava na praia Grande, debaixo dos abricoeiros no canto da praia. Foi quando
passei a conhecer bastante gente dali, inclusive o Seo Tião. E acabei alugando sua
casinha perto da cachoeira e da capela, no centro da vila. Muitas paz e muitos bons
momentos me proporcionaram aquele humilde edifício. Agora, passados tantos
anos, após uma longa caminhada desde a praia da Lagoinha, reencontrei com o Seo
Tião. Ele está morando na Fortaleza, vive sozinho; ficou emocionado no nosso
reencontro. Eu também. Era a parte da tarde, ele se encontrava sentado na
areia, encostado num muro. Disse que estava “vendo o movimento”, mas logo
subiria para casa para tomar café. Conversamos, relembramos outros anos e
pessoas. Muito agradável. Só que, acompanhar a sua fala, exige muito de mim. É
muito caiçara para a minha cabeça! Por fim me convidou para ir tomar café em
sua casa, no pé do morro, com a estrada passando perto. E a prosa continuou até
a chegada da noite. Ele, vendo que apenas uma mochila era a minha companhia, me
convidou a pousar ali, num quarto comum. Aceitei, pois a minha programação era
embarcar no próximo ônibus que partiria em direção ao centro da cidade, me
hospedar numa pousada. Tomei um reconfortante banho; jantamos com a televisão
ligada. Seo Tião gosta de novela e de ver o noticiário, mas o sono o ataca
logo. Dormimos cedo. Eu, confesso, ainda custei a dormir. Era tudo muito silêncio por
ali.
No dia seguinte, a fala do
caiçara de que “o dia começa cedo” se justifica. Ainda era escuro, mas já
estávamos tomando um café renovador. Em seguida saímos para uma caminhada
na praia. Na verdade, Seo Tião fez uma deliciosa corrida indo de canto a canto
daquela maravilhosa praia. "Eu faço isso todos os dias". Eu fui junto. Que delícia sentir o ar da manhã e
areia molhada! Que prazer poder acompanhar o Seo Tião! De volta à casa, um refrescante
banho e um café reforçado com farofa de ovos fritos. Desde os primeiros anos eu
notei e gostei desse hábito cultural local. Após esse momento, fui convidado a
subir o morro, ver a ocupação (as casas de turistas) e contemplar a paisagem lá
de cima. Um mar lindo se estendeu ao longo do nosso campo de visão. Na volta
para casa Seo Tião recolheu uma folhas? “É para temperar o peixe do nosso
almoço. Comprei uns carapaus do jeito”. Peixe com banana verde feito com
capricho pelo dono da casa foi o “manjar dos deuses”. Não teve como não dormir
depois de lavar a louça. No fim da tarde, depois de 24 horas convivendo com este
caiçara (Seo Tião), só me restou uma dívida que levarei para sempre: a da imensa
alegria de ser digno de inigualável vivência. Chegando na pousada logo tratei
de escrevê-la. Termino esta com esta observação: o Seo Tião não pode continuar
sozinho, sem alguém por perto. Mas também não pode deixar de viver naquele
refúgio de paz. Não sei como pensam seus familiares.
(Em tempo: Agradeço à Ane pela
mensagem e pelo texto).
Nenhum comentário:
Postar um comentário