Mestre Neco- Oficina de cestaria (Arquivo JRS) |
No sábado passado, na casa do Mestre Neco, vivenciamos uma oficina de cestaria com timbopeva retirada da mata durante a semana pelo mesmo. Coisa boa demais! Saberes de outros tempos que se perpetuam em nós, nos nossos, na cidadania caiçara.
Qualquer cidadão tem esta denominação
exatamente porque quer preservar, sustentar a civilidade. Caso contrário, não
faria jus ao conceito. Exercemos a cidadania para evitar o retorno à barbárie.
Temos nossos direitos e deveres para garantir o usufruto dos espaços de
igualdade, fraternidade e liberdade. Cidadania é exercer poder de intervenção e
transformação, aperfeiçoamento da vida em sociedade. Assim eu fui aprendendo e assim sigo
ensinando.
Mais acentuadamente nos últimos anos, nós brasileiros temos assistido retrocesso
no exercício da cidadania. Narrativas incabíveis até então distante da minha
mediana vivência passaram a ser corriqueiras. Exemplos: perseguição aos gêneros
distintos da dualidade homem-mulher, consideração de inferioridade aos mais pobres,
negros, índios, nordestinos etc., legalização da violência (inclusive com armas
de fogo patrocinadas pelo Estado) como medida punitiva e de extermínio contra
os desfavorecidos e opositores da barbárie, ressurgimento de ideologias de base
nazista etc. Enfim, estão por aí as hordas que ameaçam a nossa civilização, o
nosso Brasil, o nosso litoral norte paulista.
O escritor Laurentino Gomes, logo no começo do segundo volume do tema Escravidão,
faz questão de relembrar que, em 1697, saiu a notícia do desembarque em Lisboa
da primeira “partida de ouro em barra”
embarcada no Rio de Janeiro. Quem produz ainda hoje esse ouro extraído do solo
pátrio? Quem produziu toda a riqueza da cana-de-açúcar? Quem está na base dessa
minúscula parcela de milionários que querem direcionar a nossa cidadania? Mais
importante: Quem está sempre produzindo essas riquezas senão a classe trabalhadora?
É a classe trabalhadora que me interessa nas reflexões sobre a
cidadania! O já citado autor escreveu que, “em
1700, os brasileiros, sem contar os indígenas, estão por volta de 300 mil
habitantes”. E posta um detalhe: “Uma
gangue de piratas, a Irmandade da Costa, aterroriza a região do Caribe”.
Agora eu penso: essa gangue se atualizou, deixou o mar, dominou o nosso solo,
está ocupando espaços da política, patrocinando ações violentas, investindo em
discursos de ódio que se disseminam entre os próprios odiados (leia-se minorias
sociais, marginalizados, excluídos da cidadania). Na verdade, pouca gente domina
mais de duas centenas de milhões de brasileiros.
Na semana passada, estudando a partir dos conceitos de alteridade (reconhecimento e o respeito das diferenças entre as pessoas) e empatia (capacidade que uma pessoa tem de sentir e se colocar no lugar de outra pessoa), fui questionado por uma adolescente: “Por que preciso saber disso? Que resultados vai influir na minha vida essas coisas do passado?”. Por indisposição de tempo levei o espanto para casa. Agora questiono: 1- Por que nossos pais, avós etc. vieram de longe para tentar melhorar de vida em Ubatuba? 2- Por que tantos migrantes e até mesmo caiçaras moram em lugares marginalizados, em áreas impróprias? 3- O que leva vocês a assumirem as ideologias da classe dominante que se enriquece cada vez mais e é contra a justiça social? 4- Quais as implicações da alteridade e empatia no exercício da nossa cidadania?
Devemos entender uma coisa: o controle da
energia dessas crianças, adolescentes e da juventude interessa demais aos donos
do poder! Não encarar de frente muitos conceitos é dar forças a essa gangue (atualizada)
que põe pobre contra pobre para limitar/destruir a cidadania, destruir as possibilidades
de vida em abundância. É isto: cultivemos uma educação que nos ensine a pensar,
que nos libertem das correntes que nos prendem. Já disse alguém: “Ser estudioso (a) é a maior rebeldia contra
o sistema”. Alteridade e empatia são valores de todos os tempos!
Grande reflexão, Zé!
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