terça-feira, 30 de julho de 2019

IMAGENS DO FÓRUM

Ostinho e Estevan (Arquivo JRS)

Nossos produtos (Arquivo JRS)

Roberto em ação (Arquivo JRS)

Professor Diegues  (Arquivo JRS)

Algumas artes (Arquivo JRS)
Maria Eugênia aguardando a palestra (Arquivo JRS)

                 Amigo Napoleão e amigos do blog:  conforme o combinado, eis algumas imagens do Iº Fórum de Saberes Artesanais de Ubatuba.  Grande abraço.

sexta-feira, 26 de julho de 2019

PROSA DA MANHÃ

Percorrer os caminhos é um ritual (Arquivo JRS)




Artes em casa (Arquivo JRS)

               Ao sair para uma caminhada, encontrei o meu amigo Dito e seu cachorro. Como de costume, parei para “um dedo de prosa”. “Finalmente saiu a sentença, eu ganhei a causa, Zé”. Trata-se de uma questão trabalhista de alguém que passou boa parte da vida labutando em condições insalubres, em áreas de mineração (extração de granito). “Agora é aguardar os cálculos e receber”. Que bom! Tomara que ele receba mesmo (porque da doença adquirida não tem como se livrar)! Os direitos trabalhistas, assim como outros direitos, são conquistas da sociedade, custaram até mesmo muitas vidas. Ainda custam! Podemos dizer que os direitos são alguns cuidados, algumas medidas decididas pela sociedade para se proteger do Estado. E têm uma longa história! Mas quem está incluído no poder do Estado? Somente uma elite, uma minoria! Os demais estão excluídos! Daí a preocupação de sempre perseguir estratégias para manter a maioria sem condições de perceber a complexidade das manobras. Por isso a importância do uso dos recursos midiáticos para atualizar esse controle. Mas a sociedade também sabe usar a seu favor tais recursos!

               Como quebrar esse poder? Uma simples conversa, prosa gratuita, começa fazendo diferença. Meu filho acabou de deixar o seguinte bilhete: “Fui ver o Sol, eu mais o Consales e a Carol. Beijos, bom dia”. É essa juventude que já está dando prosseguimento à sociedade, está se compondo nela. Por isso acredito nos exemplos, em dar oportunidades e em valorizar tudo aquilo que vai remodelando a sociedade. Estudar para adquirir conhecimentos, usá-los com sabedoria é o ponto de partida. O primeiro passo é fazer de tudo para não acabar com nossos recursos naturais, com a natureza que nos sustenta. Assim... trabalhos focalizando tais pontos, atividades sensibilizadoras no entorno natural, prosas prazerosas e reflexivas etc. são coisas simples que não devem ser suplantadas pelas tentações midiáticas. “A Ciência é coisa boa, mas deve ser usada com sabedoria”.  Do meu jeito vou cumprindo os meus rituais de caiçara.

quarta-feira, 24 de julho de 2019

FÓRUM DE SABERES ARTESANAIS DE UBATUBA






               Quanto honra poder participar do Primeiro Fórum de Saberes Artesanais da minha cidade! Será no próximo final de semana (dias 27 e 28 de julho), com oficinas, exposição e vendas de artesanatos do povo, na área da "Praça da Baleia",  do Aquário. Legal, né?  

               Eu e minha família estaremos presentes, na maior torcida para o sucesso do evento. Levaremos algumas das nossas artes para que mais gente poder apreciar. O forte será a cestaria de jornal, mas as bonecas de pano e os livros interativos também chamarão as atenções. Acho que alguns desenhos dos filhos também marcarão presença. Por isso, todo tempo está tomado para últimos acertos nas peças. Contamos com a torcida de vocês. Eu prometo fotografar e escrever depois. Abraços. Até.
              


sexta-feira, 19 de julho de 2019

ARRELÁ! QUE PADECÊ DESSA GENTE!


Indaiás a serem semeados (Arquivo JRS)

Arte nas férias (Arquivo JRS)

               “Ah! Sempre lutando, lutando, padecendo...”. É uma expressão que não sai de moda entre os mais pobres, desde os antigos caiçaras. Hoje, mais acentuadamente, por escolhas infelizes, vemos aumentar esse sofrer, esse penar da nossa gente. Uma música nem tão antiga dizia assim no refrão: “Bem feito! Quem mandou votar no homem!?!”. Mediante a crise planejada para beneficiar, de verdade, apenas uma mínima fração da população, talvez tenhamos de retornar pouco a pouco aos antigos recursos (fazer abrigo de pau a pique, recolher sapê ou guaricanga para cobertura, redescobrir os alimentos que estão na mata, as taiobas que vicejam nas beiras dos caminhos, pescar, recolher os seres pelas costeiras na maré baixa, reaprender o tempo da brejaúba, do indaiá, dos maracujás etc. ).

             “Pra mode de quê?”. Ora, a vida é uma luta! Lembrei-me de uma situação vivida há bastante tempo, quando nem cerca havia entre as posses: 

            “Vim de  caçá depois da badeja, onde um bicho tem carrêro. Esperei, esperei, esperei... Nada de arguma coisa aparecê. Então, pra mode não vortar sem nada, calhô de reconhecê umas tralhas de cará. Tá aí, ó: a gente pode padecê, mas de fome não morre”.

               As imagens retornam, as falas se repetem na memória. Sempre tinha canoa embicando na praia ou vencendo a arrebentação para garantir o pescado. Nos jundus, nos jiraus de bambu, ficavam as panagens estendidas. As redes eram importantes instrumentos de trabalho. Ordens assim se repetiam conforme se observavam as ondas: 

             “Bota a panage na canoa e rema pra fora ligêro. Depois levanta o pano que o vento tá do jeito. O peixe tá grosso, o cardume se acomodô pra fora da laje do Saquaritá".

               Hoje sabemos que tudo na natureza tem seus limites, tornam-se escassos pelas devastações e demandas. Por isso, desde muito tempo, nas minhas andanças, levo sementes para outros espaços. Pode ser que alguém já tenha me visto, por exemplo, subindo a serra e lançando alguma coisa, em espaços de tempo, pela janela do carro. Estou semeando. Certamente que algum ser vivo já está comendo araçás, abacates, goiabas, coco jarobá e outros das sementes que deixei pelos caminhos um dia. Aprendi com os mais velhos esse costume: 

         “Pega o pau de rama, assim, bota na cava, enterra que ele nasce”, “Não é um pé de pau qualqué. Quando crescê vai sê só periquito nela: é painêra. Não estrague não”, “Acuda a sua vó no fogão. Ela tá fazendo pixé com aquele milho de treisantonte, que truxemo da roça do João Firmino”, etc.

                É, a coisa tá feia! Ou atuamos a favor de uma política a favor da maioria ou vamos mesmo por esse caminho, procurando migalhas, condenando as futuras gerações desde já.

terça-feira, 16 de julho de 2019

A REVOLTA DA ARMADA

Flâmula na FLIP (Arquivo JRS)


               É sabido que o litoral brasileiro viveu bons e maus momentos econômicos e políticos. Na verdade, eles estão sempre em intimidade. Em Ubatuba, uma das cidades do Litoral Norte paulista, houve um período próspero com a extração de madeira quando nem cidade era ainda. Depois, com a cana-de-açúcar, as primeiras fazendas se estabeleceram. Também foi um breve fausto. Na sequência, a lavoura cafeeira e as condições de sua baía para um porto deram a opulência dos casarios. As fazendas, inclusive de estrangeiros e de traficantes de escravos, se fizeram presentes pelas costas e sertões. Mas logo a cultura do café ganhou outras paragens, foi para o Vale do Paraiba, Sul de Minas e Norte do Paraná com terras mais planas e férteis, causando a ruína local. Ah! Também leis cerceando a vocação portuária cumpriram seus papéis: favorecer o desenvolvimento da Baixada Santista, onde, em 1532, foi fundado o primeiro núcleo urbano do Brasil.

               Em tempo de crise, as condições primárias de subsistência é que valem! Assim, com minguadas tropas trazendo e levando mercadorias, os ubatubanos sobreviviam se apoiando na mandioca, no peixe, na cachaça e entre produtos da terra. Até que, no final do período monárquico, uma ideia surgiu: “Vamos construir uma estrada de ferro ligando Ubatuba a Taubaté”.  O que escrevo agora é contribuição do Seo Filhinho (Washington de Oliveira), em Ubatuba Documentário:

               Com o abandono do nosso porto e sobrevindo a inevitável decadência de Ubatuba [...] tentou-se a construção de uma estrada de ferro que ligasse Taubaté a Ubatuba, substituindo a velha Estrada Imperial [a tropa que trazia ouro da distante região mineradora voltava carregada com farinha de mandioca, peixe seco, cachaça etc.], a fim de que este porto pudesse sobreviver, oferecendo condições operacionais em igualdade às de seus  concorrentes. Para custear o empreendimento foi fundado o Banco de Taubaté, onde os argentários da época investiram seus capitais.
               Como o Brasil não dispunha de indústria siderúrgica e para que as firmas inglesas pudessem fornecer o material rodante e os trilhos necessários, o Decreto Federal nº 10.150, de 5 de janeiro de 1889, deu garantia de juros de 6% aos fornecedores da projetada estrada.

               Em fevereiro de 1889 os trabalhos da construção da estrada tiveram início. Estando o trabalho adiantado, eis que vem a Revolta da Armada. E daí? Ora, a Revolta da Armada foi um movimento surgido na Marinha brasileira contra a república. Os revoltosos queriam a restauração da monarquia. Na verdade, em muitas localidades havia aqueles que comungavam dos ideais dos revoltosos. Em Ubatuba, o grupo político dominante era favorável à Revolta. Assim, as garantias do Decreto Federal foram suspensos pelo presidente Floriano Peixoto. Tudo (trilhos, vagonetes, ferramentas...) ficou abandonado, acentuando ainda mais a pobreza no município.

quinta-feira, 11 de julho de 2019

JARARACA NA BICA

Uma cobrinha nas andanças (Arquivo JRS)


               Cada um tem o frio que precisa”, dizia o Velho Artelino Flor, na minha meninice, quando despreocupado, “sem pensão alguma”, eu vivia correndo pelos morros e costeiras da Fortaleza e entorno (Saco do Zacarias, Ponta da Timbuíba, Pedra do Horácio, Canto do Cambiá, Morro da Anta, Morro do Tatu, Pedra da Igreja, Buraco da Cobra etc.).

               Dias desses, indo buscar água na Fonte da Amizade, conforme escolha de décadas, encontrei o Velho Tarcísio que mora na Figueira, no pé da serra. Ele sempre vai com uma carroça cheia de vasilhames. “Levo quantidade que dá pra um bom tempo”. É, tá certo. Afinal, ele dá uma boa pernada para recolher o tão precioso líquido. “Até tem uma mina perto de onde moro, mas eu confio mais nesta daqui. E não custa nada, né? É só não ter preguiça. Até esquenta a gente nesse frio que tá fazendo”.

               Adoro o frio! Num tempo assim, parece que o azul é mais bonito, que as matas brilham mais e que tudo fica mais sossegado. Olho na rua e vejo algumas pessoas se lagarteando, querendo aproveitar todo e qualquer calorzinho do Sol. Mas voltando à fonte, o Velho Tarcísio citou outras fontes próximas de nós, deu as qualidades delas. O que mais me chamou a atenção foi a seguinte história:

               “Você conhece a Bica do Curió, né? É uma água muito boa, muita gente faz parada ali para matar a sede e encher garrafas. Lembra daquele caso, do menino que morreu ali? Pois é! A família estava vindo de Taubaté e parou ali conforme costume. Todos tomaram água, mas quando o menino colocou a boca na bica, um negócio desceu pela goela dele. O coitado logo se estrebuchou e nem deu tempo de buscar socorro. No hospital, foram examinar a causa, era veneno de cobra: ele tinha engolido uma jararaca. Era pequeninha, mas era venenosa. Picou qualquer órgão dele e a morte veio rápido. Agora, como essa cobra foi parar ali, dentro da bica? Você sabe me dizer, Zé?”.

               É uma boa pergunta, Tarcísio. O que fazia uma jararaca no lugar do curió?


quarta-feira, 10 de julho de 2019

SÓ FALTA A MULHÉ


           
Artes da minha Gal (Arquivo JRS)
          Hoje amanheci pensando na amiga Fátima, a escritora caiçara, minha colega de escola no ginasial e no colegial, filha de João de Souza, o caiçara do pé rachado, o nosso saudoso contador de causos. O título deste é dela. O conto, que está no seu livro Arrelá Ubatuba, é o seguinte:

               Marina olhou para a folhinha de bloco encardida, pendurada na parede e viu que já era junho. Esperava por vários anos por um milagre que não acontecia. Já estava ficando velha e não conseguia se casar. Quantas promessas já tinha feito para Santo Antônio? Perdera a conta. E simpatias então? Fizera todas que sabia e que inventara. Desanimada apontou o seu dedo magro para o retrato do santo e sussurrou raivosa: “Este ano o senhor vai ver uma coisa. Não vou enfeitar o seu andor. Não vou fazer simpatia, nem promessa porque não adianta mesmo. O senhor não é casamenteiro coisa nenhuma. aguarde”.
               No dia da festa, pegou uma caixa, colocou um tijolo dentro, embrulhou direitinho, amarrou um enorme laço de fita vermelha para realçar mais e levou para ser leiloado. De olho nos lances, Marina viu o pacote nas mãos do leiloeiro percorrer todo o “arraiá” alcançando lances cada vez mais altos. Até que um sujeito meio esquisito, mas bem-apanhado, arrematou a tão preparada prenda. O coração de Marina foi à boca. Em meios aos gritos de abre! Abre! Marina tentou fugir do lugar para não participar da confusão que estava prestes a ocorrer. Atendendo a pedidos, o misterioso rapaz abriu o pacote, pegou o tijolo e gritou para que todos ouvissem:
               - Este tijolo será o primeiro da construção da minha casa. Agora só falta a mulhé!
               O leiloeiro indignado com a falcatrua arrastou Marina até o rapaz e esbravejou:
               - Não falta não. Tem ela aqui, ó!!!

sábado, 6 de julho de 2019

SOLIDÃO PRODUTIVA

Tio Neco e tio Tião  (Arquivo JRS)

Mana Ana, tio Dito  e eu (Arquivo JRS) 


               Depois de umas visitas por aí, de olhar as plantas e de fazer algumas tarefas no lar, aproveito o tempo para ler, para conversar comigo mesmo e escrever um pouco. Conforme escreveu alguém, “a leitura cria personagens internos e cria um outro em nós mesmos, de tal forma que somos cercados de pequena multidão interna”. É este conjunto procurado por mim que vai possibilitar a  minha solidão produtiva. Vários amigos e amigas dão testemunhos nisto: Pedro, recolhendo toras e galhos descartados pelos caminhos e praias, continua produzindo seus bancos, porta-lápis, abajures etc. Bispo, a partir das sucatas, monta brinquedos, jogos, utensílios variados etc. Mano Mingo escreve poesias. Minha Gal produz lindos livros interativos, riquíssimos em detalhes.  Alcides faz seus balaios de taquara. Marina produz suas mudas maravilhosas. Pedro Caetano fotografa e participa das ações ambientais. Gilda agita a associação dos coletores, recicla, reutiliza, dá outros fins àquilo que era chamado de lixo. Roberto produz suas violas. Dito se esmera no fandango. Ostinho entalha lindas peças... Enfim, gente que encontrou a solidão produtiva.

               É muito importante ter um tempo para nós! É quando lemos livros que nos esperam há meses, organizamos alguns materiais que darão impulso aos impulsos da nossa criatividade, das nossas necessidades cotidianas. “Zé, não se esqueça de terminar a nossa fonte, tá bom?”. Também estudamos, pesquisamos coisas mais sérias e coisas não tão sérias  assim. É quando cuidamos das nossas paixões nos mínimos detalhes. "Me desculpa por não ter elogiado o seu cabelo?". Vovó, em momentos assim, tranquila, na cozinha esperando a fervura do feijão, começava a recolher picumã numa lata para fazer remédio em outra ocasião. “Hoje não, menino, porque ainda preciso apanhar arruda, bengué e água empoçada na costeira. Bote ali perto da gamela”. Detalhe: ela nunca retirava tudo aquilo,  dizia que “beija-flor sempre está em busca de picumã para fazer ninho”. Ah! Esse seu jeito caiçara! Quanta saudade!

               Tempo de férias, mudanças no cotidiano. Logo as “crianças” chegam para completar o nosso lar.  As ausências temporárias de amizades especiais me fazem pensar mais em como melhorar meu empenho, em cultivá-las. É a solidão produtiva que me fez escrever e fez você ler até aqui. Curta intensamente esses momentos. Eles nos conduzem a outros valores, permitem questionar os rumos da sociedade, vivenciar outros melhores. Viva! Viva mesmo!

sexta-feira, 5 de julho de 2019

AÇÃO EM TEMPO FRIO

Imagens resistentes (Arquivo JRS)


               Olhando um guia turístico de 1980, me deparo com aquilo que é verdade ainda hoje: ninguém pode negar que a grande atração turística de Ubatuba está localizada em suas praias! Somando a isto está a vegetação exuberante que colabora para um quadro tropical de rara beleza. Não é por menos que tanta gente deixa seus lugares para desfrutar deste paraíso. Tem coisa melhor do que conviver com as belezas naturais?

               Beleza atrai gente. Assim, a cidade foi se expandindo, ocupando as áreas planas, subindo morros etc. As transformações são evidentes. Até perto das cachoeiras, que antes tinham mínimos acessos, a população já alcançou. “Ah! Mudou muito! Em 1980, a população era de 37 mil habitantes; hoje já passamos dos 100 mil. Até as condições climáticas são outras! Nunca vi ano tão quente quanto este! Vamos ver se agora em julho faz um friozinho, né?”.

               E o frio chegou. (Só não sei se vai demorar). Com ele vem o pensamento para atividades culturais que não privilegiam as praias, os banhos de mar. A cidade deve ter propostas nesse sentido, manter seu fluxo turístico, sua principal fonte de renda. Há possibilidades de festivais variados, de concursos criativos, de oficinas envolvendo até mesmo crianças e jovens em férias escolares. É  um apelo gritante!

               Agora eu escolhi algo que aconteceu no amanhecer do milênio na nossa cidade, cujas marcas ainda vemos em alguns lugares (postes, cabeceiras de ponte...): trata-se do Projeto Caminhos do Mar, uma atividade artística (mosaicos) que envolveu alunos locais, do Conselho Tutelar e do Lar do Menor. Que legal! São trabalhos simples, mas de apelo forte à preservação ambiental e cultural. E lá estão os nomes, as autorias de tais obras! Não me digam que não é marcante você ver o seu trabalho fazendo sentido, sobretudo quando uma onda destrutiva e avassaladora vai engolindo nossas riquezas naturais!?! Iniciativas assim, educativas e valorativas, devem receber incentivos oficiais, da associação comercial etc. Pessoas de até mesmo lugares distantes querem  a chance de deixar aqui boas marcas!
              

quinta-feira, 4 de julho de 2019

COISAS VELHAS PARA OS NOVOS

A espada de Possidônio  (Arquivo Rê)


               O Miro, menino bom, de tradicional família mineira, após o falecimento do pai e da mãe, por ser homem, mesmo tendo outras irmãs mais velhas, se viu no dever de chefe de família. “E agora Zé? Eu não sei bem o que fazer!”.  Eu, que até tinha me esquecido dessa tradição, propus o que é normal: que a irmã mais velha assumisse a tarefa e que os demais a ajudassem para ser bom para todos. “É assim, amigo. A vida continua!”. Mas Miro, cidadão de outros tempos, de outro lugar, hesitou. O tempo mostrou o resultado: a família se dispersou devido às atitudes autoritárias: foi-se a tradição e tudo o que era bom nela.

               Dias atrás, uma prosa com o Pedro me fez recordar do Miro. “A nossa família e mais três trabalhava no Taquaral. Lá tínhamos nossas roças, produzíamos bastante, dava para viver. De repente, o japonês nos deu uma rasteira, as três famílias 'dançaram'. A nossa sorte foi o Seo Afonso. Ele nos acolheu, ali no começo da estrada do sertão do Perequê-mirim, disse que a gente podia ficar quanto tempo quisesse. Meu pai produziu de tudo ali, até arroz e milho a gente plantou. Você se lembra? Era uma vida de muita pobreza, sem água encanada, sem luz, tendo que vender nossos produtos a troco de alguma coisa para sobreviver. Até areia a gente tirava do rio para vender. É isso, amigo: a pobreza é vergonhosa. Por isso saímos pelo mundo para ganhar dinheiro, ter uma vida melhor para oferecer aos nossos pais um final de vida com mais dignidade. Agora, estamos bem, mas dispersos pelo mundo. Acho que alguns nem voltam mais do Japão. Mas eu gostaria de reviver aquela unidade que tínhamos no tempo da miséria, de festejar à nossa maneira os acontecimentos, as conquistas, quando as nossas pobres alegrias era as maiores do mundo. Até hoje não me conformo com o que fizeram conosco: foi japonês se aproveitando de japonês!”.

               As duas situações, esses dois amigos, nos dão a noção da ocupação do espaço caiçara, a força das tradições dos diversos grupos que aqui se estabeleceram na produção agrícola, na construção civil etc. 
               As tradições pedem revisitas e revisões. Conforme o poeta-cantor Luís Perequê: “Eu vou por aí, como num velho ditado. Com muito cuidado, pisando em ovos. Falando coisas novas para os velhos, falando coisas velhas para os novos”.  Agora, depois de tanto tempo, rever essa gente, poder escutar e apoiar, saudar novas expectativas, me faz encerrar este pensando nos amigos e nas palavras do mesmo Luís: “Ter amigos como abrigo é um jeito antigo de se abrigar”.