Matias (Arquivo JRS) |
Danilo (Arquivo JRS) |
Há
trinta e dois anos nascia Danilo, filho de duas pessoas estimadas desde o tempo
de ginásio, caiçaras mesmo! Nove anos depois reencontrei o Danilo vivendo
intensamente no Saco das Bananas, aproveitando ao máximo da convivência com os avós
Dito Madalena e Constantina, sobretudo na lida do mar e da roça. O amiguinho de
reinação dele era o primo Matias. Matias nos
deixou há alguns anos, quando nem tinha vinte anos. Há poucos dias o Danilo
também se foi. Deles, além das imagens que registrei, de crianças caiçaras
sendo educadas na pequena comunidade (Saco dos Morcegos – Saco das Bananas),
guardo algumas lições vividas ou repetidas
naquele tempo. Hoje repasso esta fala do pequeno Danilo:
“Sabe que eu gosto de viver aqui? A minha
casa é lá no morro, mas passo mais tempo perto da casa da minha vó. Eu vou na
roça com ela, pesco com o meu avô e com os meus tios. Até de barco já pesquei.
Gosto muito disso tudo, mas também adoro as histórias que meu avô conta! Tem de
caçadas, de brigas por causa da terra. Sempre ele conta também dos antigos, dos
escravos na fazenda. A minha vó sabe muitas histórias de assombração. E ela tem
até hoje muito medo de coisas assim. Eu também tenho. Quase nós não vamos na
cidade, mas já aprendi muitas histórias de Ubatuba. Sabe que o meu avô é homem
corajoso, que não tem medo nem de abelha? De vez em quando ele tira mel para
nós, lá de um buraco naquela árvore grande, depois da roça de mandioca. Numa
noite ele falou assim, depois de ficar olhando um vaga-lume piscando em cima da
mesa da sala: ‘Esse bicho só trabalha de noite. De dia deve ficar dormindo em
alguma toca escura, em greta de pedra ou algum tipo de casa. A abelha só
trabalha de dia, mas trabalha muito, só falhando em dia de chuva. Quando
escurece, elas todas já estão recolhidas na colmeia, bem protegidas. Será que
não dá para cruzar vaga-lume com abelha para a gente ver mais mel ainda?’. Nós
rimos. Aí a minha vó disse: ‘Ditinho, deixa de falar besteira. Não vê que tudo
funciona bem, dá certo porque desde que o mundo é mundo as coisas, os bichos,
nós todos somos assim !?!’. E aí, desde aquela noite, eu pensei então que nós
somos só mais um ocupante desta Terra, junto com todo tipo de bicho e de mato.
Eu passarei por ela e espero deixar boas marcas”.
Então, para parar por aqui, faço
questão de citar o amigo Santiago Bernardes, enriquecido pela convivência junto
aos caiçaras da praia do Camburi, em Ubatuba:
Nossos descendentes hoje carregam muitos sangues misturados, mas enquanto houver memórias em nosso sangue eles saberão que a verdade que se conta em livros nunca foi a verdade do que se viveu aqui.