Juventino, Porfírio, Sérgio e Serginho (Arquivo Fátima) |
Dona Clície |
A
tradição oral dos caiçaras hoje se encontra enfraquecida, mas houve um tempo em
que as rodas de causos no jundu, as histórias de serão e as prosas em família
testemunhavam a nossa cultura e a reconstruíam a cada dia. Ou seja, alimentavam
nossas almas. Meus filhos (Maria Eugênia e Estevan) carregam os nomes dos
bisavós que mais contavam histórias. Assim nos formaram! Alguém duvida?
Outro
bom contador de histórias foi o saudoso Tio Izídio, um dos descendentes do Velho
Antunes de Sá, da Fazenda Caçandoca. Na verdade, ele era casado com a minha
tia-avó Luzia. Numa ocasião, tendo a atenção dos mais novos, assim começou:
“Nós
somos daqui desde muito tempo. Meu avô, o Velho Antunes de Sá comprou este
lugar do Granadeiro, o fazendeiro da praia da Mococa. As terras da Fazenda
Caçandoca começam na Pedra da Cruz, que fica na costeira da Maranduba, debaixo
do Morro do Cemitério, depois corre pelo espigão da Serra da Caçandoca até na
divisa com a Serra da Lagoa. Dali desce de novo para a costeira, na Pedra do
Um, a outra divisa.
Esse
meu avô, o Velho Antunes, tinha uma filha muito bonita já em época de se
apaixonar. Uma escrava bem jovem lhe servia de ama. Dizem as histórias que essa
cativa gostava muito da sinhazinha. Era tanta a estima que até escondia do
senhor a paixão da moça pelo filho do fazendeiro da praia da Lagoinha. Foi por
isso que, no dia que descobriu a respeito do romance, o fazendeiro se preparou para castigar a ama
que lhe omitiu a informação. Ao perceber que seria espancada, a negrinha correu
pela casa, indo para a parte de cima do sobrado que ficava no Areão [da
praia da Caçandoca], na beira do rio. Acabou ficando encurralada, com o
fazendeiro quase lhe alcançando. No desespero se jogou pelo janelão em direção
ao terreiro. Foi quando aconteceu uma coisa fabulosa: o vestido se espalhou,
igual a uma flor aberta, amortecendo a sua queda. Então ela saiu correndo pelo
caminho bem conhecido da costeira do Pulso. Já era serão, escurecia, mas mesmo
assim foi perseguida por gente da fazenda. O que lhe valeu de esconderijo foi um oco numa
grande timbuíba que existia quase chegando na Pedra do Cruzeiro, onde mais
tarde morou o Velho Salomão [pai do Élcio]. Só na madrugada criou coragem e foi bater na porta
da fazenda da Lagoinha, onde morava o rapaz apaixonado pela sinhazinha. Foi
acolhida, explicou tudo. Logo foi comprada pelo fazendeiro. Mais tarde,
conforme a história prova, deu certo o namoro dos dois jovens. Após o
casamento, a sinhazinha foi morar na Fazenda da Lagoinha e a escrava, sua
antiga ama, continuou lhe servindo. Mais tarde ela também encontrou um parceiro
e teve filhos. Gertrudes, Porfírio, Juventino, João e outros vieram desse
casal de escravos”.
Agora
eu acrescento à fala do Tio Ezídio:
Depois Juventino se apaixonou por Dona Clície e.... Maria de Fátima, Serginho e tantos outros descendem dessa fugitiva da Fazenda Caçandoca. Não é uma bela história de amor?
Muito lindo!
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