A prima Nini, em Aparecida (Arquivo JRS) |
Seja bem-vinda ao blog, Maria Célia!
De
acordo com a matéria exposta na primeira parte, o museu de Nova York encontrou as imagens vendidas pela
fotógrafa radicalizada brasileira Cláudia Andujar nos anos 1950 e 1960 em seu
acervo secundário. E, o que facilitou o pesquisador Ângelo Manjabosco, foi um
“currículo da fotógrafa para pontuar o período da vida dela entre 1955 (quando
chegou da Suíça) e 1974”. Ao final, ao ler a parte em que a fotógrafa diz:
“Comecei a fotografar porque queria conhecer o Brasil! Sempre gostei de viver
aqui, sentia que as pessoas eram mais afetuosas do que o [o lugar] que eu tinha
anteriormente”, senti a vontade de conversar, de ouvi-la a respeito da
fotografia da “menina de Ubatuba”. A primeira ideia foi encontrá-la nas redes
sociais, na internet. No entanto, as tentativas foram infrutíferas. Só sei
dizer que, hoje, a fotógrafa está com 85 anos. Seria tão bom poder ouvir suas
impressões da nossa gente daquele tempo! Por enquanto, leiamos, então, o que a
Nini escreveu:
No final de 1967, eu Maria Aparecida dos
Santos, sentia que algo forte iria acontecer, mas não sabia com quem.
Em janeiro de 1968
comecei a trabalhar na casa da Dona Dionísia Bueno Veloso, na Rua Dona Maria
Alves. Nós éramos muito pobres. Meu pai, José Messias dos Santos, nos
abandonara. A situação ficou difícil para a minha mãe Thereza Lopes e mais
cinco filhos. Eu tinha três anos na época. Aos onze anos eu comecei a trabalhar
para colaborar nas despesas de casa. Trabalhar era a solução.
No mês de
fevereiro, eu que nunca tinha entrado num hospital, nem sabia como era, sonhei
que estava no hospital com a minha mãe. As camas eram altas, os lençóis eram
brancos. No outro dia sonhei que passava na Praça Nóbrega e, no banco, estava
sentada uma mulher vestida de preto. Fui vê-la; era Nossa Senhora que estava
chorando. Passou mais uns dias. Em 23 de fevereiro cheguei da escola (estava na
quarta série). Dona Dionísia falou para eu ir na A.L.A., na casa das freiras,
buscar jornal velho para colocar debaixo do colchão, pois iria chegar gente
[hóspedes] na sua casa. Fui. Quando voltei, um carro me atropelou. O condutor
era Pavoni Júnior, estudante de advocacia. Estava se omitindo do socorro, mas
um senhor tinha visto tudo e fez com que ele me levasse até a Santa Casa de
Ubatuba. Eu estava inconsciente, coluna quebrada, cabeça arrebentada, clavícula
quebrada exposta, bacia fora do lugar. Com a batida, caiu sangue no cérebro.
Dr. De Luca, médico da Santa Casa diagnosticou que meu caso era grave e não
quis dar transferência, porque “morreria no caminho”. Passaram-se dias, eu não
morria, não sarava e ficava pior. Minha mãe tirou-me para o Hospital das
Clínicas (SP). A grande ajuda, por intermédio da minha irmã Maria Lopes, que
trabalhava na casa do Jango Teixeira, vizinho da Santa Casa, veio do Dr.
Simoneti, delegado de Taubaté e genro do Jango, que se encontrava em nossa
cidade. Ele conseguiu um helicóptero para me levar.
Eu cheguei ao
Hospital das Clínicas no dia 4 de março de 1968. [Notar que o acidente
aconteceu no dia 23 de fevereiro]; precisava da transferência por escrito do
médico. Minha prima Luzia Félix, que tinha ido junto, voltou até Ubatuba e
retornou com o documento assinado pelo médico. Minhas pernas perderam os movimentos,
eu continuava inconsciente e não enxergava. Depois a visão voltou e eu fiquei
paraplégica. Passei em cirurgia pelo Dr. Arnaldo: duas vértebras quebradas e
infeccionadas e medula comprometida. Uma vértebra não foi possível recuperar.
Fiquei internada lá mais de cinco meses; depois, no Instituto de Reabilitação,
fiquei mais 4 meses e pouco. Recebi alta em cadeira de rodas. Voltei para a
casa de parentes, pois não tínhamos casa. Logo minha irmã [Maria] casara com
Paulo João Monteiro. Foi quem nos deu um terreno onde minha mãe pediu ajuda
para os outros para construir a casa. A prefeitura da época nos ajudou. E
tivemos uma casa.
Apesar da vida de
sofrimentos, Deus sempre nos acompanhou. Minha mãe falava: “O Senhor é meu
Pastor e nada me faltará mesmo que faltasse”. A fé em Deus nos moveu. A vida
passa rápido, a felicidade e a eternidade com Deus nos espera. Aguarda a nós e
a todos. Temos que fazer a nossa parte, confiar e esperar em Deus que tudo pode
e que nos ama infinitamente é a solução. Tudo passa, só Deus é eterno.
Nenhum comentário:
Postar um comentário