Vem sol - Arquivo Clóvis |
Tio Maneco Armiro, da praia da Fortaleza, era, conforme diziam, “aceso, assanhado”. Dele, do seu jeito muito peculiar, eu me lembro muito bem desde a minha tenra meninice. Era casado com tia Aninha.
Tio Maneco e tia Aninha eram os cuidadores da capela São João Batista, bem defronte ao mar. Cansei de ver os dois nas tardes tranquilas cuidando do local com toda dedicação: varrendo, tirando pó, lavando, carpindo, podando, plantando flores, pintando etc. Eu, criança de tudo, pedia-lhes as bençãos, me detinha um pouco por ali, mas logo seguia meu caminho em busca de brincadeiras e de artes a fazer. A praia era logo ali, quinze metros depois.
Não sei se me entendem aqueles que estão longe dessas coisas antigas, desse mar, desses lugares tranquilos que um dia foram nossas praias e nossas comunidades caiçaras por toda a extensão de Ubatuba. Afinal, muita gente veio depois disso tudo. Podem até dar nomes da nossa gente a logradouros diversos, mas desconfio que pouca gente saiba de quem se trata, de como cumpriram papeis importantes na sociedade de seu tempo, como viveram como trabalhadores e como festeiros que queriam um mundo melhor.
"Aceso e assanhado” combinava com o tio Maneco. Eu não me esqueço dele me respondendo: “Eu durmo com o pilão, meu filho!”. O contexto? Na época, a tia Aninha precisou ser internada devido a um tombo na descida da casa de farinha. Eu, então, quis saber como ele estava se virando sozinho, sobretudo à noite, quando tinha de ir para a cama sem a companhia da esposa, sem o seu calor aconchegante. Ri muito com isso, com a resposta dele. Imaginei o titio abraçado ao pilão. Deixei a moradia deles rindo sozinho. “Eu posso com isso?”.
Termino esta crônica com um poema do mano Mingo:
Descendo a estrada
que leva à capela
de São João Batista
lá vai Tia Aninha
levando um buquê de flores,
justamente para pôr no altar
do criador de todas as flores.
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