domingo, 25 de agosto de 2024

A CORRIDA CUSTA....


Riquezas na mata - Arquivo JRS


   Meu saudoso tio Nelson, na maior parte da vida, foi motorista de praça, taxista. Começou ali, na Praça Nóbrega, onde é atualmente a sede da Fundart (ex-Fórum, ex-teatro), bem defronte. Ainda hoje existe ali o ponto de táxi que marcou o início da vida dele nessa profissão. Na metade da década de 1970, seus principais contratantes às corridas eram funcionários da empresa que abria a estrada (BR 101 - trecho Ubatuba-Paraty).

    Por um breve período, no início da profissão, tio Nelson morava com a gente, no Perequê-mirim, pois a praia da Fortaleza, sua comunidade originária, era longe, com acesso horrível. Assim que chegava de mais um dia de trabalho, ele sempre pedia para dar uma limpeza na kombi. Era quando eu aproveitava para ler os jornais deixados nos assentos. Aprendi muito, me alfabetizei na política mundial e nacional através das matérias jornalísticas. Mesmo controlado pela censura vigente, os textos citavam os movimentos que se opunham aos governos militares, principalmente as articulações dos estudantes, dos povos das periferias, das pastorais sociais e dos operários do ABC paulista com suas greves por melhores condições de vida

  De vez em quando, no tempo em que eu já estava frequentando o ginásio, me detinha junto dele e dos outros companheiros de profissão (Ireno, Boy, Freitas, Renatinho, Moura, K. Okase,  Espigão...) apenas para escutar as novidades. Conversavam de tudo. Ah! De quantas fofocas eu fiquei sabendo naquelas prosas dos taxistas! “Acho que nem em barbearia corre tanta fofoca assim”, gostava de repetir o titio. As interrupções importantes era uma só, quando chegava alguém perguntando: “Quanto custa a corrida até tal lugar?”.

     Eu achava engraçado o termo “corrida”. Anos, décadas se passaram. Meu tio e quase todos os companheiros dele daquela época já se foram. De repente, um escritor português me aclara o dito termo: “Ainda se usa hoje essa linguagem de cocheiro e sota”. Pois é! Faz tempo que se foram das cidades cavalos, cocheiros, charretes, sota, etc., mas a palavra “corrida” ainda vigora, convive com taxímetros, gps de última geração, câmeras e por aí vai. Mesmo existindo um visor mostrando o preço do serviço, o passageiro ainda pergunta: “Quanto custou a corrida?”


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