domingo, 27 de novembro de 2022

HÁ DE SE CUIDAR DO BROTO

 

Praia do Saco da Ribeira: privatização do espaço público - Arquivo JRS



       “...E há de se cuidar do broto pra que a vida nos dê flor e fruto” (Coração de estudante – Milton Nascimento)

 

       As previsões políticas e econômicas do Brasil para o próximo ano são medonhas, sobretudo para os mais pobres que nem imaginam o que seja especulação financeira, neoliberalismo e geopolítica. Todos os programas básicos (saúde, educação, moradia etc.) estão defasados e com orçamentos falidos, parte do plano de um presidente desonesto e de extrema-direita. Considerando que os deputados e senadores eleitos são, sobretudo, empresários e latifundiários dessa mesma ideologia, os boicotes a qualquer medida visando amenizar as desigualdades sociais aumentarão. Quem sofrerá mais?

      Me agarro à questão cultural para me fortalecer. A cultura caiçara, os traços culturais herdados dos mais antigos renovam a esperança que eu tenho na vida. Estou cada vez mais convicto que é por esta narrativa que eu vivo, converso com as pessoas, escrevo e educo os meus filhos. E reconheço que cada cultura traz em sua origem princípios semelhantes, querem a vida feliz, desejam a vida plena. Na semana que passou eu tive de questionar um jovem caiçara, cujos pais e avós eu conheço bem, pelo motivo de dizer tolamente que “caiçara é vagabundo, por isso que esse tanto de gente vem para cá na temporada ganhar dinheiro”. Ele deveria estar pensando até agora nesta pergunta que deixei para reflexão: “Então os seus pais, o seu avô Daniel e a sua vó Maria são vagabundos? Você, que rala desde cedo até o escurecer, é vagabundo?”.

       Agora, mais do que nunca, reconheço que precisamos focar nas narrativas. A disputa de narrativas é o eixo para perseverar na nossa humanização. Não podemos deixar que discursos de ódio elaborados pela classe dominante (branca, machista, preconceituosa, vingativa etc.) invadam nossos princípios caiçaras e das diversas culturas que preenchem, desde o advento do turismo, o espaço litorâneo privilegiado que ocupamos no planeta. O meu medo, notando o que se propaga pelas redes sociais e abraçada por tantos do meu povo, é, conforme a música cantada por Milton Nascimento, que o broto esteja sendo estragado e comprometendo totalmente o futuro. Assim, faço questão de rememorar uma parte da História: no ano de 1942, na defesa da pureza da raça, os nazistas avançaram na discussão da “solução final” com a construção de eficientes campos de concentração, onde os mais aptos se tornavam mão de obra escrava. E os demais? Eram submetidos a experiências horrendas, exterminadas sob gás letal, deixados a morrer de fome, frio e sede, incinerados ou lançados em valas comuns. Um médico nazista teria escrito depois do primeiro morticínio por gás: “Comparado a isso, o inferno de Dante parece comédia”. E agora me apego ao escritor Ian Crofton acerca dessa gente, dessas pessoas que se tornaram cúmplices de Hitler e foram envolvidos na execução dessa triste solução: “Não eram monstros desumanos e, sim, homens e mulheres que haviam sido tão doutrinados que acreditavam estar fazendo seu trabalho de maneira eficiente e de acordo com a vontade do líder máximo”. Pergunto a todos se percebem a escuridão que se instalou no Brasil, sobretudo com o golpe de 2016 aplicado pela classe dominante. O que emergiu da podridão, dos esgotos da sociedade? É esta mesma narrativa (contra as minorias e contra as injustiças sociais que fundamentavam a “solução final” dos nazistas que fizeram horrores indizíveis) que é abraçada por gente do meu povo! É essa gente que está chocando o ovo da serpente, o nazifascismo evidente na sociedade brasileira atual. Triste ver caiçaras e migrantes doutrinados nos mesmos ideais do nazismo e do fascismo.

   Quem são os caiçaras? Uma minoria social!

   Quem são os migrantes (mineiros, baianos, cearenses, paraibanos etc.)? Minorias sociais!


   Se queremos vencer a escuridão, ousemos na narrativa que remova ignorância, maldade e ideologia de rebanho. Ousemos educar para o exercício da cidadania na justiça social!


2 comentários:

  1. É muito triste ver vítimas assumindo o discursos dos seus algozes julgando arrogantemente que estão certas. É urgente "educar para o exercício da cidadania na justiça social."

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