Eu e Joana (Arquivo Lu) |
Grande Joana Célia! (Arquivo André) |
Assim que eu cheguei na secretaria
da escola, o primo Zé Roberto me mostrou uma fotografia: “Conhece, né? Acabou de falecer por causa da dengue hemorrágica”.
“Nossa! É a Joana Célia, filha do Zé Raé! Não acredito!”.
Joana Célia Tavares, caiçara do
canto da Lagoinha (onde hoje é o Recanto da Lagoinha, moravam quatro
famílias originárias), nossa conhecida desde o tempo em que a vovó Martinha
morava no Sapê, era uma pessoa muito agradável, sempre disposta a uma boa prosa
sobre as coisas de caiçara. “Papai fazia
balaio, desses que você faz, mas usava taquara e cipó”. Seu pai, Zé Raé, vendia
peixe por ali mesmo, entre Lagoinha, Pontal, Porto do Eixo e Sapê. Depois de
muito tempo, eu a reencontrei na escola, quando voltou a estudar no CEEJA-
Massaguaçu. Em 15 de dezembro de 2017 essa estimada pessoa concluiu o Ensino
Médio. Que prazer ter a alegria em fazer parte dessa etapa da vida de alguém que, desde que eu me
lembro, sempre trabalhou muito, serviu à comunidade (ultimamente era agente na
pastoral da criança na igreja católica). Por mais de vinte e cinco anos viajou
desde a praia da Lagoinha para trabalhar em casa de família no Saco da Ribeira.
Chegava sempre cansada na escola. Após um dia puxado de trabalho ainda encontrava
forças para desenvolver o seu aprendizado. “Estou
cansada, Zé. Tem dia que até penso em parar de estudar porque já não sou tão
nova assim. Só que eu sinto falta dos estudos quando estou nas minhas tarefas,
na igreja. Eu não vou desistir não”. E a Joana não desistiu.
Eu me lembro de uma prosa assim
entre nós: “Você conheceu o tio Chico
Raé?”. “Lógico! Ele morava na Estufa;
era casado com a Mercedes, da Praia Dura. Depois de viúva, ela se casou de novo
e mora até hoje na Sete Fontes”. “Eu sei. De vez em quando me encontro com ela
no Saco da Ribeira”. “Joana, o seu tio Chico Raé andava sempre bem arrumado, em
sapatos impecáveis. Estava sempre com óculos escuros por causa da sensibilidade
à luz. Foi ele quem me explicou sobre os antigos Raé, gente que se dizia ter
vindo da Suiça para compor uma colônia no Itaguá, na Fazenda Jundiaquara”.
Mais tarde, lendo um documento,
achei a preciosa informação um dia dada pelo Chico. No relato de um cônsul suíço,
designado para verificar as condições dos patrícios atraídos para o trabalho no
Brasil colonial, apareceu uma revelação: de todas as localidades visitadas,
apenas em Ubatuba ele foi obrigado a dar razão ao fazendeiro, pois os
imigrantes preferiram o ritmo caiçara, escapando da lida determinada pelo
proprietário. Resumindo: eles perceberam logo o que era melhor. E assim, os Raé
e outros suíços se acaiçararam, deram suas contribuições no nosso caldo
caiçara. Partiu a guerreira Joana, gente dos Raé! Ela e o pequeno Arthur, vítima da meningite, seguem juntos.
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